A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

quinta-feira, 12 de março de 2015

O DIREITO DE NÃO TER LADO



ZERO HORA 12 de março de 2015 | N° 18099



RODRIGO MUZELL*



Por esta eu não esperava. Depois de anos vivendo em um país que penou para reaprender a deixar todo mundo dizer o que pensa, sofremos agora o cerceamento em um direito que nem sabíamos ser fundamental: ser ponderado.

Entre dois domingos de protestos contra o governo, estamos em uma semana na qual é quase impossível ser razoável. Se eu digo que é óbvio que roubos na Petrobras sempre existiram, mas que está na cara que a situação degringolou no governo petista, sou massacrado pelos governistas. Se digo que é estupidez pedir impeachment – porque dissolver o Executivo colocaria o país nas mãos de um Congresso cujos presidentes são investigados por corrupção –, sou execrado pelos oposicionistas.

O debate político entre as torcidas organizadas Geral do Impeachment e Camisa Dilma (obrigado ao meu amigo Igor Natusch pela nomenclatura) exige que todos tenham lado. Quem não tem filiação é medroso, quem critica um dos lados mas garante não ser de lado algum é mentiroso. Desistiram de qualquer debate – inclusive de discutir o que é mesmo pensar de forma independente.

Não é por acaso que “golpe” seja uma palavra tão associada a “impeachment”. Assim como nos anos 60, o diálogo está empobrecendo, quase sumindo. Na época, o medo do comunismo era o rótulo usado para resumir tudo. “Quer reforma agrária? Comunista!”. Hoje, é o repúdio à corrupção. “Quer cautela antes de chamar a presidente de ladra? Safado!”. E por aí vamos, rede social e WhatsApp afora, com gritarias de parte a parte.

A coisa está tão grave, que dá vontade de aplaudir até aquelas ações cheias de segundas intenções. Exemplo: a postagem no perfil de Dilma de um card no qual a presidente, sob a imagem de uma simpática panela, lembra que protestar é direito de todos e deve ser respeitado. Claro que há cálculo político: mostrar grandeza depois que seus militantes passaram três dias ironizando o “protesto coxinha”. Mas também há sensatez em tentar diminuir ânimos. Do outro lado, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso critica a presidente até a raiz dos cabelos, mas lembra que impeachment é loucura. É pouco, mas de comemorar, nesta época difícil de dizer a verdade sem ter de sair correndo.

Lembro de quando era difícil ser radical. Agora, o desafio é ser ponderado. Não lembro de nenhuma época na História em que isso tenha dado muito certo.

*Jornalista, editor de Notícias/Digital rodrigo.muzell@zerohora.com.br

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