A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

terça-feira, 10 de abril de 2012

O SILÊNCIO DOS INOCENTES


Gilmar Bortolotto, Promotor de Justiça - ZERO HORA 10/04/2012

O Brasil é o terceiro país do mundo com o maior número de presos. São cerca de 500 mil encarcerados. Estamos falando de milhões de pessoas envolvidas no problema, uma vez que todos somos atingidos pela insegurança.

Nas centenas de estabelecimentos penais existentes em diversos municípios brasileiros, a cena se repete: presos empilhados, facções, desrespeito, doença, morte, corrupção e muita conivência. Parece difícil compreender como chegamos a tal ponto. Afinal, a execução das penas deveria simbolizar o mais cristalino exemplo de justiça em um país supostamente civilizado. Andar na contramão tem sido a nossa opção.

Entender o significado disso tudo pode ajudar-nos no difícil exercício da racionalidade quando o tema é o sistema carcerário. Há quem diga que a principal função dos muros de um presídio é impedir que os que estão fora fiquem sabendo o que acontece lá dentro. É verdade. A oportunidade de fiscalizar cadeias demonstra que ainda há grande diferença entre o que ocorre no interior dos estabelecimentos penais e a informação que é produzida pelo meio oficial. É como se, inconscientemente, tivéssemos desenvolvido uma cultura que busca ocultar os pecados cometidos nas prisões. Assim é que o que chega à mesa de autoridades que devem decidir sobre as questões atinentes à execução poucas vezes reflete o que ocorre nos presídios.

O papel tem essa virtude: permite tornar insípida e inodora a realidade. Tudo, então, passa a ter explicações. Administração promovida por presos, domínio do crime, violência e violações de toda espécie chegam relatados de forma a permitir a digestão adequada para quem tem a difícil tarefa de “engolir” tal refeição. Entretanto, sempre há o risco de que os muros sejam transpostos e que um pouco da verdade venha para fora.

Nesse caso, para que tudo fique bem, é preciso explicar o inexplicável. Entra em operação, então, a segunda etapa do processo, quando perguntamos: sabe qual foi o crime que este sujeito cometeu? Assim tem sido ao longo de décadas. Deixamos de raciocinar. Em centenas de municípios do Rio Grande do Sul e do Brasil, a barbárie campeia em nosso pátio. Basta ir olhar. Entretanto, seguimos aceitando as meias verdades produzidas no papel e as justificativas que propõem que o responsável exclusivo por isso tudo é o delinquente (foi ele quem escolheu isso). E nada de transpormos os muros.

Enquanto for assim, não teremos paz. Não há o que seja ruim para uns e bom para outros. Não existem dois mundos – o de quem está preso e o de quem está solto. Não podemos pretender segurança de país civilizado com presídios medievais. Estamos dando o exemplo. Seguimos, em alguma medida, ocultando a verdade e justificando a barbárie. Assim, todos os dias, homens de bem, podemos dormir o sono dos justos, afinal, somos todos inocentes.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Em todos estes anos, que motivos teve e tem o MP de silenciar diante destas comprovadas condições desumanas, insalubres, permissivas, inseguras oferecidas por quem tem o dever de guardar e custodiar seres humanos presos à disposição da justiça? Em todos estes anos, que razões impediram o MP de denunciar o Chefe do Executivo por violação de direitos humanos no sistema carcerário? Se o próprio MP silencia, o que esperar da sociedade?

Portanto, a solução é perguntar ao cidadão se existem motivos para continuar pagando salários elevados e máquinas públicas onerosos como o Ministério Público, Judiciário e Assembléia Legislativo, se estes silenciam diante da calamidade humana que ocorre dentro dos presídios gaúchos. Para serem inoperantes, não há razão para se gastar tanto com estes três poderes.

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