A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

domingo, 4 de março de 2012

O JAPÃO DESAFIA A MÁFIA YAKUZA


PODER PARALELO. O JAPÃO QUE DESAFIA A MÁFIA - MARTIN FACKLER | KITAKYUSHU, JAPÃO - ZERO HORA 04/03/2012

Nascida no século 17 em centros urbanos como Osaka, a Yakuza infiltrou-se na sociedade japonesa, influenciando os negócios, a política e até o esporte. Agora, em pleno século 21, o Japão moderno e desenvolvido tenta extirpá-la das entranhas de seu cotidiano
Dois anos atrás, as autoridades de Kitakyushu, uma corajosa cidade japonesa, declararam guerra à Yakuza, a toda-poderosa organização criminosa do país. Desde então, houve ameaças de morte ao prefeito e a sua família, granadas foram lançadas contra casas de executivos de empresas que se negaram a fazer negócios com a máfia, e o presidente de uma construtora foi morto a tiros na frente da mulher.

A polícia diz que os ataques e outras táticas de intimidação são obra dos Kudokai, uma gangue com mais de 650 membros que os policiais consideram como uma das mais perigosas facções da Yakuza. A máfia mantém-se, há séculos, incrivelmente visível no Japão. Especialistas, porém, argumentam que o exemplo de Kitakyushu pode se transformar em um divisor de águas – a população está farta da criminalidade.

Qualquer aura romântica que possa ter envolvido esses criminosos no passado está se dissipando, segundo as autoridades. Os japoneses veem a Yakuza cada vez mais como meros mafiosos, como seus colegas de outros países, que ganham dinheiro com drogas, jogos de azar e extorsão, especialmente de seu alvo favorito: a rica indústria japonesa da construção civil.

– Hoje, as pessoas estão enxergando a realidade, de que a Yakuza é simplesmente uma força criminosa – declarou o prefeito de Kitakyushu, Kenji Kitahashi, que garante não ter se intimidado com as ameaças de morte.

Segundo ele, a violência colocou muitos moradores contra a Yakuza. A guerra entre a polícia e os mafiosos afetam os esforços da cidade em atrair novos investimentos.

O Japão tentou conter a Yakuza em quatro grandes momentos desde o início da década de 1990 e não conseguiu provocar mais do que um pequeno estrago em seu efetivo. Atualmente, a organização japonesa conta com cerca de 80 mil membros (frente aos 5 mil da máfia americana em seu apogeu, no início dos anos 1960). Como muitas gangues japonesas, os Kudokai mantêm até mesmo um quartel-general público, o Kudokai Hall – uma fortaleza de quatro andares cercada por altos muros, arame farpado e câmeras de segurança, localizada no centro de Kitakyushu, antiga cidade produtora de aço, com 1 milhão de habitantes.

Até recentemente, a Yakuza era tolerada porque ajudava o Japão a manter suas ruas seguras, impondo, no mundo do crime, as mesmas regras rígidas e hierarquia que são vistas no restante da sociedade japonesa. Mas, conforme o país se transformou em uma nação moderna de classe média, sua sociedade também passou a contar com tribunais e advogados para manter a ordem, e não criminosos medievais.

A crescente intolerância diante do submundo ficou evidente em escândalos recentes, nos quais um famoso comediante da TV e o sumô, esporte nacional, foram forçados a cortar relações com os gângsteres.

– A sociedade usou a Yakuza por tanto tempo, e é duro, agora, simplesmente se livrar dela – disse Chikashi Nakamura, 76 anos, presidente de uma associação de moradores de Kitakyushu.

A Agência Nacional de Polícia, que estabelece a política nacional contra o crime, explica que uma criminalização total é difícil devido a proteções constitucionais ao direito a reuniões públicas. Shigeyuki Tani, diretor de inteligência do crime organizado da agência, porém, defende uma nova lei que designaria gangues como a Kudokai como “especialmente perigosas”, tornando mais fácil para a polícia entrar em seus prédios e prender membros. Autoridades de Kitakyushu dizem precisar de poderes ainda mais fortes para combater o crime organizado. Dos 44 tiroteios ligados à máfia no Japão no ano passado, 18 ocorreram na região de Fukuoka, distrito da ilha mais ao sul do Japão, Kyushu, onde Kitakyushu está localizada.

A atual onda de violência começou há dois anos, quando os Kudokai irritaram moradores locais ao comprar uma mansão em frente a um jardim de infância para usar como escritório. Após vizinhos protestarem nos portões da casa, a residência do líder de uma associação de moradores foi alvejada. Autoridades locais reagiram com novas penalizações, buscando cortar as fontes de renda da gangue. Em resposta, os Kudokai lançaram ofensivas contra as empresas que interromperam os pagamentos – incluindo ataques com granadas contra casas de executivos da Kyushu Electric Power. Em 17 de janeiro, atiradores feriram o presidente de uma construtora quando ele saía de casa.

No quartel-general da gangue, o cartão de visita de Hiroshi Kimura, escrito em elaborados traços de caligrafia, identificava-o como o capitão de um dos subgrupos dos Kudokai. Educado, ele conduziu os repórteres a uma sala com poltronas macias e uma mesa baixa, parecida com uma típica sala de reuniões corporativa no Japão – exceto pelos retratos em preto e branco na parede, exibindo líderes falecidos da gangue. Conforme falava, homens corpulentos, vestidos com ternos pretos, ajoelhavam-se silenciosamente para servir xícaras de chá verde e doces tradicionais.

Kimura explicou que as novas restrições haviam prejudicado os Kudokai, recusando-se a entrar em detalhes sobre os acordos financeiros da gangue. Ele afirmou que o grupo não estava por trás dos recentes atos de violência, mas admitiu que poderiam ter sido obra de algum membro errante da gangue. Se isso for verdade, ele prometeu aplicar sua própria punição. Acrescentou que a polícia compartilha a culpa pela violência, por forçar uma separação entre os Kudokai e a comunidade.

– Se nos esmagarem, o crime organizado vai ficar mais difícil de ser identificado. E a violência vai aumentar, como ocorreu no México – explicou.

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